Aturdido no vácuo de um devaneio, acorda inerte. Suspenso no leito pungente, purgatório afiado cuja forma molda-se em crueza e ausência. Tristezas eclodem sólidas nas lanças que riscam assustadoramente o vazio. Violam, todas elas, em profundo açoite, a carne já molestada .
O vermelho explode quente como úlcera a cada estocada. Expõem-se tendões, veias e músculos rompidos. Dos cantos recônditos arrastam-se soturnas criaturas corpulentas. Multiplicam-se sedentas, cada vez maiores.
Sente o hálito de suas mucosas desdentadas a sugar-lhe o sumo da carne exposta. Sente a entranhada dor violenta dos membros decepados. Arrancam-lhe agora a pele imergindo o corpo numa insuportável ardência.
Não há mais forma e sim um caldo vermelhíssimo.O que sobrou de gorduras e vísceras borbulham espessos num invólucro orgânico. A consciência latente conecta o líquido, subproduto do pavor e do sofrimento, a qualquer definição de existência.
Da experiência de morte, brota um corpo renascido
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Então, descansa indolor. Em vagarosa labuta, a vida volta, aos poucos, a mover suas engrenagens. Tudo o que restou conecta-se a um ritmo de sussurro. Uma certeza aérea infla os espaços.
Abre os olhos. Um novo coração se apressa em acordar o corpo ressurgido. Pelas veias, as batidas aceleradas apressam o sangue renovado.
Um frescor primaveril preenche, enfim, todo novo organismo. Irrompe o casulo que abrigou sua morte e ressurreição. Sem olhar para trás expande toda a envergadura de seus novos braços. Levanta-se. Respira. E experimenta, sem vacilo, a liberdade dos novos passos.
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