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Em quatro anos, renda não teve melhora significativa nos EUA

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Nos anos de Donald Trump, até a pandemia, o rendimento dos trabalhadores menos ricos aumentou mais do que no segundo mandato de Barack Obama (2013-2016); cresceu mais do que a renda de quem está no topo da pirâmide. São dados da Pesquisa das Finanças do Consumidor do Banco Central dos EUA, o Fed, publicada no mês passado. O patrimônio dos menos ricos também cresceu mais.

Quanto ao PIB, o crescimento de 2016 a 2019, sob Trump, foi de 7,7%, ligeiramente maior do que nos anos finais de Obama, de 7,5% (2013-16). Em relação à União Europeia, os EUA cresceram mais nos dois períodos, diferença também diminuta: 1,3 vez mais com Obama, 1,4 vez com o republicano.

O PIB americano pode ter sido ligeiramente acelerado pelo aumento do gasto público nos anos Trump. O déficit primário no ano final de Obama fora de 2,4% do PIB (déficit primário: despesas maiores do que receitas, afora gastos com juros). Sob Trump, cresceu progressivamente até os 4,1% de 2019. Excluem-se os dados de PIB e déficit de 2020, pois o ano não terminou e é historicamente excepcional.

O autoelogio hiperbólico de Trump não tem respaldo nos fatos do emprego, embora o ritmo de criação de postos de trabalho durante seu governo tenha sido muito bom e, provavelmente, difícil de acelerar, pois a economia já crescia havia oito anos quando ele assumiu. De 2016 até 2019, o número de pessoas empregadas cresceu 4%. Nos anos equivalentes de Obama, 4,9%.

A taxa de desemprego chegou a 3,5% (2019), a menor em 50 anos. A escassez relativa de mão de obra levou empregadores a elevar salários e benefícios para manter empregados treinados e a contratar pessoas menos qualificadas ou mais discriminadas (negros, mulheres pobres e ex-presidiários).

No entanto, a melhoria foi ligeira, embora tenha revertido a tendência de aumento forte da desigualdade vista no segundo mandato de Obama. De resto, quanto à renda média, trabalhadores no quinto mais pobre da população tiveram ganhos menores, assim como aqueles que não completaram o ensino médio.

Mas as perdas relativas maiores ocorreram entre os 10% mais ricos, entre os brancos não hispânicos e os que fizeram faculdade. Na renda mediana, houve ganhos para quase todo mundo.

O aumento do preço dos imóveis e das ações contribuiu para elevar o valor do patrimônio dos menos ricos. Cerca de 65% dos americanos são proprietários de imóveis; o outro ativo relevante de sua riqueza é ação de empresa (o peso desses ativos no patrimônio dos 10% mais ricos é relativamente menor).

A pesquisa do Fed é trienal, com dados entre 2013 e 2016 (para Obama) e de 2016 a 2019. Dados do mercado de trabalho para 2019 indicam que continuava a tendência registrada no levantamento.

As políticas de Trump, de modo intencional ou impremeditado, acabaram por promover essa ligeira redução na desigualdade? Provavelmente não. Governos têm poder limitado de acelerar o crescimento econômico no curto prazo e de promover mudanças estáveis e relevantes nas medidas de igualdade --são mais capazes de causar destruição.

No mais, as principais decisões de Trump na economia não influenciaram de modo visível as melhorias de renda, fracassaram em seus objetivos ou pioraram a situação das contas públicas. Trata-se aqui da redução de impostos para empresas, de alguma desregulamentação, do abandono e a revisão de tratados comerciais, do protecionismo e do aumento de taxas de importação, em especial de produtos chineses.

A redução de impostos não esteve associada a um aumento da taxa de investimento (em instalações produtivas, equipamentos, programas de computador) além do registrado no início do governo. Em 2019, havia sinais de que a despesa de capital das empresas diminuía.

O protecionismo e a guerra comercial tiveram efeito contrário ao desejado. O déficit comercial americano (diferença entre exportações e importações de bens) aumentou ainda mais, para os maiores valores em um quarto de século, pelo menos. O nível de abertura comercial ficou estagnado. Na UE e na média dos países da OCDE, o comércio aumentou em relação ao PIB.

O fato de o país ter déficit ou superávit comercial não é em si sinal de piora ou melhora econômica. Mas Trump não conseguiu nem diminuir o déficit comercial, e as medidas protecionistas não contribuíram para a melhoria das condições de vida em regiões decadentes devido à desindustrialização.

A participação dos empregos industriais no total de empregos subiu um pouco até 2018 (o que não poderia ter sido efeito de políticas de Trump) e cai desde então. Vários desses indicadores estão em um artigo de Paul Krugman ("Why Did Trump's Trade War Fail? Notes Toward a Proper Paper"), de outubro.

É razoável especular que seria muito difícil que o protecionismo pudesse atenuar de modo relevante o declínio industrial. Dados sobre a economia regional dos EUA indicam que o crescimento é mais acelerado nos estados da Costa Oeste (polos tecnológicos), no Texas, na Flórida e em pequenos estados do Centro-Oeste e do Sul com mão de obra mais barata.

É mais razoável acreditar que, no curto prazo, um governo possa prejudicar o crescimento do que acelerá-lo. Embora a guerra comercial de Trump começasse a causar algum dano, antes da epidemia (incerteza, desaceleração de investimento etc.), o PIB americano resistiu até chegar a calamidade da Covid.

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