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'Garota, Mulher, Outras', de autora que vem à Flip, reflete bem a atualidade

(FOLHAPRESS) - No ano passado, "Garota, Mulher, Outras" figurou entre os livros favoritos de Barack Obama, ex-presidente dos Estados Unidos, e foi considerado pelo jornal britânico The Guardian o romance da década.

Ainda no mesmo ano, o livro foi vencedor do Booker Prize, tornando sua autora, a escritora britânica de origem nigeriana Bernardine Evaristo, a primeira mulher negra a receber o prêmio, considerado o mais importante para a literatura de língua inglesa.

Desconhecida da maior parte do público brasileiro, Evaristo tem carreira bastante prolífica. Além de escritora e dramaturga, ela é professora de escrita criativa na Brunel University London e vice-presidente da Royal Society of Literature. O romance é seu oitavo livro, mas o primeiro a ser publicado no Brasil.

É um projeto bastante ambicioso, como testemunham as quase 500 páginas de texto, que chegam ao país pela tradução primorosa de Camila von Holdefer.

"Garota, Mulher, Outras" aborda assuntos como feminismo interseccional, relações de raça e de classe, questões de gênero e sexualidade, imigração e diáspora. O leitor que se interessar encontrará referências bibliográficas e literárias em meio aos diálogos das personagens, alguns "easter eggs" dos estudos culturais deixados por Evaristo em sua ficção.

É possível dizer que o romance é parte de uma chamada literatura engajada, mas a obra está longe de ser panfletária – a preocupação da autora com a poética é tão central quanto seu engajamento.

A característica polifônica do romance – as narrativas são em primeira pessoa e possuem momentos de intenso fluxo de consciência – torna sua leitura um exercício complexo, dinâmico e, por vezes, inebriante. As tramas das personagens transbordam umas nas outras e se entrelaçam, fascinando também quem está em busca de uma boa história.

O livro é dividido em cinco partes. As quatro primeiras contêm as narrativas do coletivo de personagens que protagoniza o romance (11 mulheres e uma pessoa não binária) e a quinta traz o evento em que todas elas se encontram, além de um epílogo.

A fluidez é a principal marca de "Garota, Mulher, Outras", e é dessa maneira que a autora rompe com o discurso colonial. De acordo com o filósofo Homi Bhabha, este depende do conceito de fixidez para sustentar os estereótipos que ignoram a alteridade.

O caráter fluido do romance está tanto em sua estrutura narrativa quanto na construção das personagens. Os parágrafos são desconstruídos, desobedecendo a normas de pontuação, estratégia que aproxima o romance à escrita poética.

O coletivo de personagens também foge dos estereótipos. A protagonista mais nova, Yazz, tem 19 anos de idade e a mais velha, Hattie, 93. Suas origens são igualmente diversas, passando por lugares como Inglaterra, Nigéria e Barbados.

Há personagens com posição política bastante definida, como Amma, a dramaturga negra, lésbica e socialista. E há as que não se importam com política, como Carole, que cresce numa escola da periferia, ganha uma bolsa de estudos na Universidade de Oxford e se torna uma workaholic muito bem sucedida.

Bernardine Evaristo desenvolve seu projeto de proporções épicas com uma maestria que faz jus ao importante prêmio recebido e torna "Garota, Mulher, Outras" não apenas o romance da década, mas uma referência literária digna da diversidade e complexidade de nosso tempo.

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