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Teatro republicano e temor de violência ofuscam sessão que sela vitória de Biden

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Donald Trump transformou 6 de janeiro em uma espécie de "Dia D" de sua guerra para tentar reverter o resultado da eleição que perdeu. As chances de que consiga um novo mandato desta forma, porém, são praticamente nulas. Ainda assim, o presidente busca outros ganhos, como manter apoiadores engajados e o reforço da narrativa falsa de que houve fraude.

Nesta quarta, o Congresso fará uma sessão conjunta para somar os votos dos delegados do Colégio Eleitoral e declarar Joe Biden como vencedor da eleição, por 306 a 232 votos. A cerimônia é momento simbólico, comparável à diplomação presidencial feita pelo TSE no Brasil. Mas neste ano o evento virou outro palco para Trump, que fala em fraudes sem apresentar provas.

O plano do republicano para este dia inclui uma grande manifestação nas ruas de Washington e o questionamento de parlamentares sobre o resultado das urnas durante a sessão no Congresso.

O dia começará com a Marcha para Trump pela manhã, nos arredores da Casa Branca, e deve seguir ao longo do dia. Postagens na internet citam caravanas saindo de vários estados, e o próprio presidente promete participar do ato, que pede "transparência e proteção à integridade da eleição". Roger Stone, lobista indultado por Trump, e Rudy Giuliani, advogado do republicano, devem estar presentes.

A manifestação também deve atrair ativistas de extrema direita. Como muitos deles costumam andar armados, há temor de confrontos na capital --mesmo com restrições ao porte de armas no ato. Por isso, a prefeita, a democrata Muriel Bowser, pediu reforço da Guarda Nacional.

Às 13h (15h em Brasília), começa a sessão no Congresso. Ali, os votos dos delegados serão abertos e lidos pelo vice Mike Pence, que comandará a cerimônia por acumular o cargo de presidente do Senado. Ele será um mestre de cerimônias, sem poder para mudar o andamento da sessão por conta própria.

Durante o anúncio dos votos, há espaço para que parlamentares questionem a validade dos apoios, e ao menos 11 senadores republicanos já afirmaram que recorrerão ao dispositivo. Por vias legais, este plano não tem como dar certo: para invalidar votos dos delegados, é preciso de aprovação por maioria simples no Senado e na Câmara. Nesta última, os democratas possuem mais da metade dos assentos, e eles não votarão para tirar a Presidência de Biden, também democrata.

A contestação precisa ser feita estado por estado, o que também minimiza as chances de sucesso. Biden venceu em diversas regiões decisivas, de modo que reverter o placar em apenas um deles tampouco mudaria o resultado final. No entanto, os pedidos podem atrasar a certificação.

Cada questionamento oficial demanda uma análise nas duas Casas, que deve ser feita em até duas horas. Se houver pedidos de reanálise em seis estados, por exemplo, a cerimônia pode se estender até a madrugada, enquanto protestos ainda poderão estar ocorrendo do lado de fora.

"Quanto mais esse processo demorar, mais se criará tensão em Washington, o que pode ser usado para alimentar a narrativa de que se tramou um golpe contra Trump", analisa Felipe Loureiro, coordenador do curso de Relações Internacionais da USP.

Os parlamentares republicanos aliados ao presidente também devem aproveitar a ocasião para ficarem mais conhecidos e tentarem se aproximar dos eleitores de Trump, que teve 74 milhões de votos populares em novembro --Biden somou 81 milhões.

"Como vocês podem imaginar, estou sendo pressionado pelo establishment de Washington e Wall Street a ignorar a vontade das pessoas e evitar levantar a questão", disse o senador Josh Hawley, em um pedido de doações, citado pelo New York Times em reportagem. Republicano, ele defende questionar o resultado das urnas, embora Trump tenha vencido no Missouri, estado que ele representa.

A postura contestadora racha o Partido Republicano. O senador Ben Sasse, do Nebraska, acusou o grupo de apontar "uma arma carregada ao coração de um governo legítimo". Já o senador John C. Danforth, também do Missouri, disse que os questionamentos são parte de uma estratégia populista para dividir a América ao promover teorias da conspiração. "É o oposto de ser conservador, é ser radical", defendeu.

Ao final da apuração e dos possíveis questionamentos, caberá a Pence anunciar oficialmente a vitória de Biden, em momento transmitido pela TV.

Desde que o Código Eleitoral de 1887 entrou em vigor, houve apenas dois questionamentos aos votos do Colégio Eleitoral. Em 1969, um delegado da Carolina do Norte votou em um candidato que defendia a segregação racial em vez de seguir a votação popular, que elegeu Richard Nixon.

No plenário, esse voto foi questionado. E, em 2005, uma senadora democrata questionou o resultado de Ohio, alegando supressão de votos. Ambos os pedidos foram rejeitados nas votações.

Vencida esta etapa de certificação, o próximo e último evento da transição de poder será a posse de Biden como presidente, no dia 20 de janeiro. Há dúvidas se Trump irá à cerimônia --não será surpresa se ele fizer um comício próprio ao mesmo tempo em que o democrata é empossado.

Resta ver quem o acompanharia neste palco.

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