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Artes e a pessoa com deficiência

Garantir acessibilidade a produtos culturais não significa alterar seu conteúdo, mas promover igualdade de retransmissão das informações

Mateus Lima – Professor e pessoa com deficiência visual (Arquivo Pessoal)

Escrito por Mateus Paulo de Lima

29 NOV 2021 - 17H33 (Atualizada em 29 NOV 2021 - 18H03)

Arquivo Pessoal

Oi gente! Se aproxima o final de mais um novembro. Mês de finados, da soberania republicana e da consciência negra. Períodos e datas de muitas celebrações culturais, ou seja, de muitas manifestações artísticas. Deste modo, pensando no universo plural dos espetáculos públicos e a baixa promoção de acessibilidade presente nestes, objetivei discorrer sobre este tema, porque entendo ainda existir muito silêncio, falta de compreensão e até negligência sobre o mesmo.

Da história antiga aos movimentos virtuais mais modernos, celebrar ritos, estabelecer tradições e provocar sentimentos, sempre foram entusiasmos próprios da natureza humana. Tudo, frequentemente, valendo-se da arte, expressão maior das inspirações comuns dentro dos nossos contextos sociais. E onde entra a pessoa com deficiência? No direito a igual necessidade de acesso a tais eventos. Produtos culturais a serem projetados também para a realidade das diferenças. Refiro-me a obras como peças teatrais, cinema e som, ritos religiosos, festejos populares, dentre outros.

Atualmente, o Brasil até dispõe de legislação vigente sobre tornar acessível a dinâmica das apresentações públicas, mas por falta de conhecimento e de aplicabilidade, quase sempre, essa discussão inclusiva ainda não se faz fato no momento de se construir um evento coletivo. É importante ressaltar que garantir acessibilidade a produtos culturais como espetáculos de dança, musicais, shows, palestras, peças teatrais, cinema, etc, não significa alterar seu conteúdo, mas promover igualdade de retransmissão das informações nele presentes. É necessariamente pensar e executar um evento organizado sob padrões que também permitam à pessoa com deficiência prestigiá-lo, independentemente de seu grau de mobilidade ou nível sensorial. Em síntese, trata-se de oportunizar ao cadeirante, cego, surdo e pessoas com mobilidade reduzida, a chance de também interagir, sorrindo, admirando e se emocionando com o que está acontecendo ao seu redor.

Como tornar, por exemplo, uma peça de teatro democraticamente acessível? O primeiro passo é a busca por promover o evento em local já arquitetonicamente adaptado ao acesso de cadeirantes e pessoas com baixa mobilidade. O segundo passo, visando atender a comunidade surda e pessoas com deficiência auditiva, acrescentar a execução do espetáculo, também intérpretes de LIBRAS, nossa Língua Brasileira de Sinais. Pensando no público de cegos e pessoas com deficiência visual, um terceiro passo consiste ainda em providenciar áudio-descritores para narrar os acontecimentos e encenações, oferecendo-lhes visão por meio de palavras.

Como é que isso acontece? Tudo deve estar organizado considerando como sanar as diferenças, exemplo, levar som aos surdos e visão aos cegos por vias de uma comunicação adaptada as possibilidades destes públicos. Imagine um palco onde, em local fixo e dentro do campo visual do todo, palco e cenário, devidamente iluminado e discretamente posicionado, também esteja o intérprete de LIBRAS, ouvindo e repassando instantaneamente tudo o que é dito, sem que haja interferência nem desfoques visuais do individuo deficiente auditivo que acompanhe o espetáculo. Quanto aos deficientes visuais, radiotransmissores com fones de ouvido lhes são entregues na entrada do espetáculo para utilização simultânea durante a realização do mesmo. Por exemplo, na base, enxergando o todo, mantem-se o profissional áudio-descritor, atento, dizendo na frequência do rádio como trajam os artistas, suas características físicas, o que fazem e como estes se portam em cena. Enquanto isso, espalhados normalmente pela plateia, com seus fones, felizes, os deficientes visuais prestigiam o evento ali construído também para eles e sua limitação. Conforme exemplo, tanto a tradução em LIBRAS quanto a áudio-descrição, ambas precisam estar em sintonia com o que acontece no palco.

Qual o impacto financeiro para tornar um evento acessível? Como pensar em custos é, sem dúvida, a mais pertinente das considerações, talvez seja indispensável conhecer antes a disponibilidade regional de profissionais e empresas que ofertam esses serviços. Não deve existir, por parte dos organizadores, motivos para desesperar-se ou deixar de incluir acessibilidade a seus eventos, pois esse mercado de pessoas e empresas que prestam assessoria e consultoria multifuncional, é pujante e já está presente na maioria das médias e grandes cidades. Uma nova indústria que possibilita terceirizar as necessidades inclusivas decorrentes para cada formato de apresentação.

Conhecedor de seu público alvo, é respeitável que promotores de eventos, como em qualquer nicho mercadológico e necessariamente nessa ordem, busquem por melhor qualidade primeiro e melhor preço em seguida. Aqui não é possível aprofundar-se em métodos e técnicas, mas uma consulta rápida à internet, algo sobre (como promover acessibilidade e inclusão ao meu evento?), também apresentará muitos conteúdos norteadores, uteis e gratuitos. Assim como o selo ambiental, atualmente, o elemento inclusivo eleva o padrão pessoal e empresarial dos organizadores, o que não deixa de ser um bom e justo marketing individual e corporativo.

Concluindo, seja em apresentações artísticas, palestras, musicais ou mesmo exibições com fotos e imagens gráficas, boa vontade pessoal, sensibilidade social, filantropia corporativa e parcerias educacionais, também são alternativas de se agenciar o debate e a realização de eventos integradores. A proposta dos conteúdos deve estar na democratização de seu acesso. Uma igualdade de entretenimento e saberes absorvíveis por todos e todas, promovendo a verdadeira inclusão. Pensemos nisso. Dúvidas, sugestões de tema e observações afins, contate escrevereincluir@gmail.com e vamos continuar ambicionando uma sociedade mais justa e integradora. Um universo cidadão de todos para todos.

Escrito por
Mateus Lima – Professor e pessoa com deficiência visual (Arquivo Pessoal)
Mateus Paulo de Lima

Professor e pessoa com deficiência visual

Graduado em pedagogia. Pós graduado em: Ciências Sociais pela PUC Rio e Políticas Públicas pela PUC DF

Atuou 10 anos como professor da rede estadual do Estado de Rondônia nas disciplinas de Sociologia, Filosofia e Educação Especial

Atualmente trabalha com palestras motivacionais

escrevereincluir@gmail.com

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