SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A continuação de "Space Jam" só deve estrear em julho, mas já é dos assuntos mais comentados do cinema. Isso porque o filme se tornou o mais novo alvo das guerras culturais que marcam os dias de hoje.
Dirigido por Malcolm D. Lee, ele agora traz o principal jogador dos Lakers, LeBron James, contracenando com os clássicos personagens do Looney Tunes. Ou alguns deles.
Conhecido pelo seu mau-cheiro e jeito insistente com as garotas, o cangambá francês Pepe Le Pew foi cancelado --em todos os sentidos.
A única cena em que o bichinho aparecia foi cortada depois de uma enxurrada de críticas que o acusavam de incentivar a cultura do estupro e o comportamento abusivo. A cena mostrava o personagem, vestido de barman, tentando beijar à força uma mulher, que reprova o ato.
A produção informa que o corte aconteceu há mais de um ano, embora o anúncio só tenha sido feito pouco tempo depois da publicação de um texto de Charles M. Blow, colunista do New York Times.
No texto, Blow faz duras críticas a conteúdos infantis que, segundo ele, propagam opressões estruturais, como o racismo e o machismo, e cita como exemplo o personagem Pepe Le Pew e os livros de Dr. Seuss. Seuss, aliás, teve recentemente alguns de seus livros tirados de circulação pela empresa que administra o seu espólio por esse motivo.
"Ele é realmente abusivo", diz o psicanalista e sexólogo Marcelo Bernstein, sobre Pepe Le Pew. "Uma criança pode tentar repetir o que vê. É preciso explicar que não devemos copiar o personagem."
Segundo o psicanalista, seria mais interessante se o filme mantivesse a cena e o forçasse a mudar o comportamento.
Já a professora universitária de arte e educação Luciana Grupprlli Loponte, 52, afirma que o ideal pode não ser nem o corte de cena nem a revisão de conduta, o que evidencia a complexidade desse tipo de discussão.
"O que devemos fazer com obras clássicas do Ocidente que promovem algum tipo de violência contra à mulher?", questiona. "Artistas como [Peter Paul] Rubens e [Pablo] Picasso, por exemplo, têm obras que naturalizam a objetificação feminina. É uma discussão urgente."
O cangambá não foi o único a causar dores de cabeça nos produtores do novo "Space Jam".
Ao contrário do Pepe Le Pew, a coelha Lola Bunny não foi cancelada. Mas tem uma aparência bem diferente daquela do primeiro filme.
Sem roupas justinhas, que mostravam uma silhueta sexy, a coelha veste uniformes bem confortáveis. Seus seios não estão mais aparentes.
A mudança aconteceu porque o diretor optou por "priorizar as habilidades atléticas de Lola Bunny e abandonar a objetificação do primeiro filme", como afirmou à revista Entertainment Weekly.
Apesar das críticas ao visual sexy da coelha serem antigas, o sexológo Bernstein nega ter reparado nisso quando assistiu aos filmes e desenhos da Looney Tunes.
"Eu vejo desde criança, mas nunca vi a Lola como um objeto sexual", diz ele. "Acho que dizer que todo espectador vai reduzi-la só por causa de uma roupa é uma afirmação categórica."
Ele lembra que apesar da sua sexualização excessiva no primeiro filme, Lola não deixou de ser retratada como alguém forte, que derrotava inimigos masculinos sem dificuldades.
Há quem comemore o novo visual da coelha. É o caso de Loponte, que diz ter ficado espantada com tantos comentários contrários à mudança.
"Ninguém reivindicou que o Pernalonga fosse mais viril, mas reivindicam que ela continue sexualizada", afirma.
Ao que tudo indica, os personagens de "Space Jam" continuarão rendendo polêmica. Prova disso é Ligeirinho. O esperto camundongo é o mais recente candidato ao cancelamento por causa dos estereótipos que perpetua sobre os mexicanos, segundo seus críticos.
Seu dublador, Gabriel Iglesias, nega as acusações de que o personagem seria uma representação racista dos mexicanos. "Você não consegue me pegar, cultura do cancelamento. Sou o camundongo mais rápido do México", debochou o ator no Twitter.
Nem a saída nem a continuidade de Ligeirinho foi confirmada pela Warner.
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