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‘Rei do asfalto’, Covas vende mobilidade, mas privilegia transporte individual em SP

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Atual prefeito e postulante à reeleição em São Paulo, Bruno Covas (PSDB) tem se vendido como candidato que aposta na mobilidade urbana, tema que, segundo ele próprio, é um dos mais importantes da campanha.

Sua gestão à frente da prefeitura, no entanto, privilegiou o recapeamento de ruas à criação de corredores de ônibus e reforma de calçadas e acabou colocando os carros em primeiro lugar.

Covas foi eleito em 2017 como vice de João Doria (PSDB), que prometia construir 72 km de corredores de ônibus. Depois que Doria renunciou ao cargo para disputar o governo estadual, Covas assumiu e baixou a meta para apenas 9 km.

No entanto, nem isso entregou até o momento.

Segundo a própria gestão Covas, desde 2017 foram feitos 6,6 km de novos corredores exclusivos, tidos como essenciais para a cidade.

A prefeitura diz que os corredores não foram construídos pois não recebeu recursos do Ministério das Cidades e focou em "melhorar o que já existe", reformando 116 km de vias exclusivas.

De 2017 a 2020, a prefeitura orçou inicialmente R$ 1,5 bilhão para corredores, a maior parte desse valor (R$ 691 milhões) para construção de novos trechos. Mas, nos quatro anos da gestão Doria-Covas, foram gastos R$ 245 milhões, 16% do previsto --o orçamento depois foi revisto para a casa dos R$ 660 milhões.

A gestão já começou com Doria aumentando os limites de velocidade das marginais Tietê e Pinheiros, promessa de campanha que foi um aceno aos motoristas. Quando se olha os gastos, de novo esse público é contemplado.

Nas obras de recapeamento de asfalto e tapa-buraco vistas por toda a cidade, a gestão tucana gastou R$ 1,04 bilhão, 63% do orçado inicialmente (R$ 1,64 bilhão). Ao longo da gestão, essa previsão subiu para quase R$ 2,5 bilhões, segundo levantamento da Folha.

Segundo a gestão, foram batidas com antecedência metas de recapear 3,6 milhões de metros quadrados de vias e tapar 540 mil buracos.

Os gastos com recapeamento foram impulsionados pelo programa Asfalto Novo, usado por Doria para se eleger governador e continuado por Covas.

"‹A prefeitura diz que esses serviços fazem parte da manutenção da cidade e que estão entre os principais motivos de ligação para o 156, canal de atendimento da gestão, e citou que recursos de privatizações frustradas e também de repasses federais afetaram obras de calçadas e corredores.

Entusiasta das desestatizações, a gestão Covas tentou duas vezes conceder os terminais de ônibus da cidade à iniciativa privada, argumentando que melhoraria a qualidade do espaço e do entorno, mas não teve sucesso.

Na primeira tentativa, em abril de 2018, o projeto, que permitia a construção de prédios comerciais ou salas de escritórios, não atraiu interessados e foi abortado.

A segunda tentativa, no começo deste ano, permitia a construção de moradias em cima dessas estruturas, mas acabou suspensa por determinação do Tribunal de Contas do Município, que apontou irregularidades no edital.

A gestão Covas também reduziu o número de embarques permitidos com uma única tarifa do vale-transporte: de quatro embarques em duas horas para dois em três horas.

Além disso, passou a cobrar R$ 4,57 nessa modalidade em vez dos R$ 4,30 da tarifa comum à época, em 2019. A prefeitura justifica que com isso economizou mais de R$ 400 milhões que podem ser investidos em outras áreas.

Mesmo a criação de vias exclusivas para bicicletas acabou sendo errática. Da noite para o dia, ciclovias importantes da cidade amanheceram apagadas, sem nenhum aviso, como a faixa da rua Artur de Azevedo, importante ligação entre a Faria Lima e a região do fim da avenida Paulista e a avenida Doutor Arnaldo, todas na zona oeste da cidade.

Após queixas e mobilização, a prefeitura espalhou cartazes afirmando que a faixa estava sendo refeita e que seria implantada depois. Ainda espalhou cones para delimitar o espaço dos ciclistas, privilégio que outras regiões da cidade não tiveram enquanto as faixas não eram reimplantadas.

Ainda houve outras exemplos de descoordenação, como a requalificação da ciclofaixa da rua Rêgo Freitas, na região da República (centro). A via foi apagada em fevereiro para requalificação e ,em abril deste ano, foi refeita. Mas a novidade não durou seis meses. Em setembro, uma obra mexeu em todo o asfalto e mais uma vez apagou a ciclofaixa, então recente. A via para bicicletas ainda não foi refeita.

A prefeitura diz que a obra foi feita pela Sabesp (companhia de saneamento), que também fará novamente a sinalização da ciclofaixa.

Também houve avanços e atendimento de demandas antigas de faixas exclusivas, como na avenida Rebouças. A maior queixa na região, no entanto, é que a faixa ficou muito estreita, porque considera como espaço de circulação a calha da rua, reduzindo o espaço para ciclistas.

A gestão Covas diz que recapeou o piso e fez reforma nas guias e sarjetas para deixar o espaço nivelado, com 1,2 metro de largura, mas a reportagem passou pelo local e viu que a calha continua desnivelada. A administração diz que o espaço vai proporcionar mais segurança aos 700 ciclistas que já circulavam diariamente por lá mesmo sem estrutura exclusiva e que o retorno tem sido positivo.

Os balanços financeiros mostram que nos quatro anos foram gastos R$ 76 milhões na reforma de calçadas, menos de 10% do previsto --segundo a administração, a variação entre os valores orçados e empenhados se dá porque parte dos investimentos seria custeada por recursos do Plano de Desestatização que não se concretizaram.

Com a proximidade das eleições a reforma de calçadas ganhou novo gás e o centro da cidade virou um canteiro de obras, com reformas constantes.

A prefeitura afirmou que está fazendo o "maior programa de caminhabilidade, com o foco na acessibilidade, no qual estão sendo requalificadas 1,5 milhão de m² de calçadas até o final deste ano em toda a cidade, com o investimento de R$ 140 milhões".

A gestão diz que o investimento não prevê só a reforma, mas instituiu novo padrão de acessibilidade. Questionada sobre por que as obras começaram perto do pleito, a administração diz que o projeto é "executado de acordo com as disponibilidades financeiras e orçamentárias".

Para Rafael Calabria, do Idec (Instituo Brasileiro de Defesa do Consumidor), o desempenho da gestão Covas na área de mobilidade foi insatisfatório, tanto por omissão em debates importantes como por paralisia em outras áreas.

"A gestão é fraca, nem comparada ao Haddad, que fez ciclovias. É fraca comparada ao Kassab, que não é reconhecido pelo trabalho com mobilidade, mas que foi quem fez as ciclofaixas de lazer, as bicicletas compartilhadas e começou a pensar a redução de velocidade máxima", diz.

Ele cita ainda a dificuldade de continuidade de programas em uma gestão que teve quatro secretários de Transporte e a confusão com os bloqueios em avenidas e rodízio severo no começo da pandemia, medidas revogadas dias depois de anunciadas. Como ponto positivo, ressalta o bloqueio de trânsito de carros no centro histórico nas últimas sextas-feiras do mês, mas ressalta que é muito pontual.

A gestão Covas disse que usa valores empenhados por considerar um "retrato mais acurado", em vez do orçamento liquidado, usado pela reportagem. Segundo a pasta, por esse recorte, foram empenhados R$ 368,7 milhões nos corredores, R$ 181 milhões nas calçadas e R$ 1,7 bilhão em recapeamento e tapa-buracos.

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