SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Bruno Covas (PSDB) chegou ao cargo de prefeito da maior cidade do país como um político discreto, com atuação forte nos bastidores. Cerca de dois anos e meio depois, ele enfrenta seu maior teste ao encarar as urnas pela primeira vez como cabeça de chapa para uma eleição majoritária.
Sem marcas de gestão e a bordo de uma grande coalizão, Covas centra a campanha na própria experiência de luta contra o câncer e enfrentamento de períodos turbulentos que incluem uma pandemia. A aposta vem dando certo, e ele lidera com folga a disputa nas pesquisas.
Então não muito conhecido, Covas assumiu o posto de vice do candidato João Doria (PSDB) como uma tentativa de pacificar o tucanato rachado pela presença de um outsider na cabeça da chapa. Era o começo de uma nova era no PSDB, na qual antigos caciques perderiam o poder.
Embora seja membro do grupo do governador, Covas desde o começo tentou demarcar a diferença entre os dois --nunca embarcou na onda ultraconservadora que varreu o país com a eleição de Jair Bolsonaro à Presidência.
Na primeira fala como prefeito, exaltou a política, após Doria ter sido eleito dizendo que não era político, mas gestor. Enquanto Doria lançava programas e slogans, vestia-se de gari e vivia em embate com adversários e a imprensa, Covas tirou o pé do acelerador e apostou em terminar obras iniciadas por Fernando Haddad (PT) --algumas até hoje não entregues.
Na campanha de 2020, Covas escondeu Doria na propaganda, e rivais buscaram destacar a ligação entre eles, mirando a rejeição ao governador.
O prefeito assumiu o cargo em um novo momento da vida, quando havia perdido 16 quilos, começado a fazer exercícios e raspado a cabeça.
Inicialmente, teve a fama de baladeiro. No primeiro ano de gestão, passou mais de 40 dias afastado viajando. Estava na Europa em março de 2019, quando a região metropolitana enfrentou enchentes que mataram 13 pessoas.
A imagem do prefeito mudou após diagnóstico, em outubro de 2019, de um câncer em estágio avançado no trato digestivo. No início do ano seguinte, viria a pandemia.
Paralelamente ao tratamento, Covas manteve o trabalho e se mudou para a prefeitura no ápice da pandemia.
Sua gestão foi favorável a medidas duras para promover o distanciamento social, algumas mais restrititivas do que as propostas por Doria --como adiar a abertura das escolas quando, segundo a regra estadual, poderia abri-las.
A gestão criou dois hospitais de campanha e conseguiu conter a falta de leitos e respiradores que assolou outros locais. Por outro lado, promoveu medidas questionadas, como bloqueios no trânsito e um rodízio ampliado.
Em outubro, pesquisa revelou que a aprovação do prefeito no enfrentamento à pandemia subiu de 39% para 46%.
Para aliados de Covas, o câncer e a pandemia aumentaram muito o nível de conhecimento do prefeito e sua popularidade. Na campanha, a retórica é de prestar contas da gestão, o que não teria sido possível devido a tantas situações emergenciais, que incluíram desabamento de um prédio no centro, rachadura em um viaduto na marginal Pinheiros e a pandemia.
Sem grandes marcas na gestão, como as ciclovias e faixas de ônibus de Fernando Haddad (PT) ou a Cidade Limpa de Gilberto Kassab (PSD), ele tenta se vender com um resolvedor de problemas. O fato é que, até o fim de outubro, havia cumprido apenas 33 das 71 metas, o equivalente a 46%.
Entre as metas não cumpridas estão a entrega de 12 CEUs, baixar para 30 dias de espera de exames prioritários e implantar 10 novos parques.
A gestão de Covas privilegiou o transporte individual, ao diminuir a meta de 72 km de corredores de ônibus para só 9 km e apostar boa parte das fichas (e verbas) em um programa de recapeamento.
Habilidoso, Covas conseguiu passar projetos importantes na Câmara, como a reforma da Previdência. O bom trânsito, porém, se dá também às custas de loteamento de cargos para vereadores.
Covas costuma dizer que o que gosta de fazer na vida é política. Nesse ponto, o avô é até hoje sua grande referência. Na adolescência, Covas deixou Santos e foi morar com o avô, então governador.
O início na política foi em 2004, como vice na chapa de Raul Christiano à Prefeitura de Santos, que foi derrotada. Após dois anos, foi eleito deputado estadual. Em 2010, foi reeleito com 239 mil votos, a maior votação do estado.
Foi secretário de Meio Ambiente (2011-2014) na gestão Alckmin, de atuação discreta.
Em setembro de 2014, durante a campanha eleitoral, um ex-assessor de Covas foi flagrado transportando R$ 102 mil em espécie, sem documento que comprovasse sua origem, e 16 cheques em branco assinados "Eleição 2014 Bruno Covas Lopes".
A Justiça Federal tratou o caso como suspeito de lavagem de dinheiro. Bruno Covas não foi investigado. Em 2018, a apuração foi arquivada por falta de provas. Na eleição de 2014, foi eleito deputado federal com 352 mil votos.
Da época como deputado, é possível ver um registro de Covas no documentário "Democracia em Vertigem", de Petra Costa, durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff (PT). Mais gordo, ele aparenta comemorar o processo com outros políticos.
Após assumir a prefeitura, porém, Covas passou a fazer acenos à esquerda. O principal marco do processo foi a chegada de Alê Youssef ao cargo de secretário da Cultura --ele promoveu um festival na cidade contra a censura.
"Ele é diferente dos políticos que surgiram recentemente, como Doria, Bolsonaro e [Wilson] Witzel [governador afastado do RJ]. O Bruno é mais discreto, e essa discrição dá a ele a chance de se situar no centro, na medida em que não fica dando declarações que o compliquem", diz o cientista político Marco Antonio Teixeira, da FGV.
Covas enfrentou momentos de tensão com Doria durante a dobradinha tucana. Para Teixeira, vencendo a eleição, ele pode passar a ser um concorrente do governador dentro do PSDB, reeditando rivalidades como a de José Serra e Geraldo Alckmin.
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RAIO-X
Bruno Covas Lopes, 40
Formado em direito na USP e em economia na PUC-SP, é divorciado e pai de um adolescente. Foi deputado estadual com 26 anos. Foi reeleito e virou secretário estadual do Meio Ambiente. Em 2014, elegeu-se deputado federal. Em 2016, vice-prefeito na chapa de João Doria. Assumiu a prefeitura em abril de 2018.
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