Por Meon Em RMVale

Representantes de instituições de ensino e pesquisa deixam Conselho de Meio Ambiente de São José

Em carta à sociedade, pesquisador do Inpe e professores do ITA e da Unesp apontam cerceamento de discussões no Comam

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Vista do Bosque Betânia, área verde na Avenida Tívoli, uma das questões que geraram embates no Comam

Arquivo/Meon

Os três únicos representantes de instituições de ensino e pesquisa no Comam (Conselho Municipal de Meio Ambiente) de São José dos Campos pediram exoneração alegando impossibilidade de uma "efetiva participação técnica, democrática e cidadã" no grupo. Deixaram o Conselho o pesquisador Evandro Albiach (Inpe) e os professores Wilson Cabral de Sousa Júnior (ITA) e Klécia Gili Massi (Unesp).

Os três divulgaram uma ‘carta à sociedade joseense’ explicando os motivos da saída do Comam. “Desde que se iniciaram os debates em relação ao Bosque Betânia, perpassando as tratativas relacionadas ao Plano Diretor Municipal, atingindo um ápice quando das tentativas de discussão técnica e ambiental em torno da obra da Ponte Estaiada, percebemos uma imposição de agendas, cerceamento de discussões que consumiam todo o tempo em apresentações infindáveis e não profícuas, postergação e obstaculização de discussões e da construção conjunta de soluções, além de um recrudescimento de postura do Executivo municipal, refratário às manifestações contrárias dos conselheiros”, diz trecho do documento (leia íntegra da carta abaixo).

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Formado por 34 conselheiros, representantes do Poder Público (17) e da sociedade civil (17), o Comam tem papel consultivo e de assessoramento às políticas relacionadas ao meio ambiente do município. Entre outras atribuições, é função do Conselho propor normas para proteção ambiental do município, fornecer subsídios técnicos e prever possíveis riscos ambientais que ocorram ou possam ocorrer no Município, propondo apuração e as providências necessárias.

Procurado pelo Meon, o pesquisador Evandro Albiach disse que a saída dos três representantes foi necessária não apenas por discordarem da condução do Conselho, mas também para ‘resguardar’ as instituições que eles representam.

“A gestão da Seurbs [Secretaria de Urbanismo e Sustentabilidade], que pauta de maneira inflexível e bastante incisiva as discussões do Comam, optou claramente por manter as instituições apenas como forma de legitimar suas posições, sem de fato colocar à disposição do debate e de ideias complementares, papel esse inerente às instituições que representamos”, ressaltou o pesquisador do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).

Segundo ele, os debates e contribuições propostos pelos três representantes eram vistos como mera ‘oposição’ ao governo municipal. “Um evidente equívoco de leitura por parte do poder público local, talvez muito permeado pela polarização política insana e irracional sob a qual estamos vivendo”, disse Evandro. 

A professora Klécia ressalta que o pouco que conseguiram avançar nas discussões do Conselho foram às custas de muito desgaste e de muito embate. “Tínhamos que retirar os nossos nomes dali, só o fato de estar presente nas listas das reuniões, faz com que a gente assine embaixo de coisas que não concordamos”, ressaltou.

O professor Wilson ressalta a dificuldade de discussão em questões relevantes como a ponte Estaiada e o Plano Diretor, também citados na carta aberta.

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Debate sobre a ponte estaiada também causou divergências no Comam   

Maquete Virtual/Divulgação

“Pedimos uma Câmara Técnica para discussão do Plano Diretor e, quando decidiram criar, deram 11 dias para manifestação. Com esse prazo não faz sentido ter uma câmara técnica”, disse Wilson.

Outro Lado
Procurado pelo Meon, o presidente do Comam, o advogado e ambientalista Lincoln Delgado, nega que haja pressão da prefeitura sobre o Conselho e coloca a saída dos três conselheiros como questões políticas pessoais.

“Temos que deixar bem claro que [as colocações dos três representantes exonerados] não são palavras das instituições. Tenho certeza que as instituições Inpe, ITA e Unesp não coadunam com essa mesma posição.

Ele ressalta que o Comam é um conselho misto de assessoramento ao Executivo. “Infelizmente, não é um conselho só da sociedade civil. Então todas as decisões que passam por votação, se tiver uma pessoa da sociedade civil que concorde com o posicionamento da prefeitura, já é maioria. Infelizmente, democracia é dessa forma, ganha a decisão da maioria”, disse Lincoln.

Ele ressalta que todas as questões apresentadas pelos três conselheiros nas reuniões foram acatadas e constam nas atas das reuniões, realizadas pelo menos uma vez por mês.

“Tá acontecendo uma briga política, não estou dizendo partidária. O WIlson e alguns poucos querem ir para o lado esquerdo, outros querem ir para o lado direito e a gente não chega a um consenso. Se a gente não sabe viver em democracia, em que a maioria querendo algo a gente tem que acatar, aí fica dificil. É o Fla-Flu que tem acontecido nesse país e tem refletido em todas as esferas, inclusive municipal e, infelizmente, no Conselho Municipal do Meio Ambiente”, disse o presidente.

A Secretaria de Urbanismo e Sustentabilidade não comentou a saída dos três conselheiros, apenas informou que a Secretaria Executiva do Comam não recebeu nenhum comunicado oficial das instituições que têm representantes no Conselho com relação à substituição de membros.

Leia a íntegra da Carta Aberta à Sociedade Joseense assinada por Evando, Klécia e Wilson


Diante da responsabilidade a nós atribuída, como representantes de instituições de
ensino e pesquisa junto ao Conselho Municipal de Meio Ambiente - COMAM, e tendo em vista
nosso recente pedido de exoneração destas atribuições junto à nossas instituições, vimos a
público apresentar nossas considerações à sociedade.

Como professores e pesquisadores cônscios de nosso papel social, havíamos nos
colocado à disposição de nossas instituições (UNESP, INPE e ITA) para bem representá-las
junto ao COMAM. Estávamos imbuídos de um espírito de cooperação e colaboração para o
aprimoramento das questões de ambiente e sustentabilidade em São José dos Campos, como
sempre estivemos, neste ou em outros fóruns.

A Constituição Federal (em seu Artigo 29) prevê a “cooperação das associações
representativas no planejamento municipal”. A Lei Orgânica do Município também garante a
participação popular nas decisões. E a Lei de criação do COMAM indica como competência do
Conselho “fornecer subsídios técnicos para esclarecimentos, relativos à defesa do Meio
Ambiente, aos órgãos públicos e principalmente à comunidade.”

Foi dessa maneira que nos pautamos: tentando fornecer subsídios técnicos ao poder
público, além de atendermos a demandas da sociedade civil joseense. Uma leitura atenta das
atas das reuniões pode redimir quaisquer dúvidas.

No entanto, desde que se iniciaram os debates em relação ao Bosque Betânia,
perpassando as tratativas relacionadas ao Plano Diretor Municipal, atingindo um ápice quando
das tentativas de discussão técnica e ambiental em torno da obra da Ponte Estaiada,
percebemos uma imposição de agendas, cerceamento de discussões que consumiam todo o
tempo em apresentações infindáveis e não profícuas, postergação e obstaculização de
discussões e da construção conjunta de soluções, além de um recrudescimento de postura do
Executivo municipal, refratário às manifestações contrárias dos conselheiros. Não obstante, a
ação do executivo municipal passou a ser de questionamento e até de tentativas de
constrangimento à participação destes representantes que ora se manifestam.

Diante destes fatos, e da impossibilidade de uma participação técnica, democrática e
cidadã de nossa representação no COMAM, solicitamos às nossas instituições a exoneração da
condição de representantes naquele Conselho. Alertamos também para o fato de que estas
representações da sociedade civil no COMAM, incluindo as instituições de ensino e pesquisa,
têm sido utilizadas apenas como legitimadoras (como geradoras de quórum) de um processo
em que a Prefeitura simplesmente utiliza sua amplitude numérica, em detrimento dos reais
anseios da sociedade no que tange às questões ambientais e de sustentabilidade.

A despeito da presente iniciativa, é importante salientar o papel das instituições de
ensino e pesquisa junto aos Conselhos Municipais. São elas a aportar a vertente mais técnica
às políticas públicas municipais, além de exercer o controle social diante do poder executivo,
no que tange aos assuntos de sua tratativa. Não se trata de ser “contra” ou “a favor” de um ou
outro empreendimento e sim de exigir que ritos legais e demandas legítimas da sociedade (no
caso, ambientais) sejam respeitados nos projetos públicos, e o debate em torno de obras
públicas possa inclusive aprimorar tais projetos. A omissão dos representantes destas
instituições nos Conselhos seria um desserviço à sociedade e uma quebra de princípios de
conduta ética e cidadã, princípios caros aos propósitos de nossas instituições.

Por fim, estamos e estaremos sempre dispostos a contribuir para o aprimoramento
das políticas públicas municipais, especialmente às que se associam ao nosso tema de
magistério e pesquisa. Esperamos que uma mudança na condução de tais fóruns possa levar a
uma participação mais profícua em prol do desenvolvimento sustentável e da qualidade de
vida da sociedade joseense.
Respeitosamente e cordialmente,

São José dos Campos, 23 de abril de 2019

Evandro Albiach
Klécia Massi
Wilson Cabral

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