Jersey, Inglaterra
Arquivo pessoal
CAPÍTULO III - A CERTEZA DA VERDADE
A igreja Messiânica, fundada por Mokiti Okada, cujo nome religioso é Meishu Sama, me ensinou muitas coisas desde o dia em que, desnorteada por um fracasso profissional, daqueles que você só entende fazendo uma leitura sobre o contexto do universo e de como Deus nos ensina como filhos desobedientes, cheguei até lá. Quando esse tsunami passou por cima de mim, me senti a mais fracassada das mulheres. Investi em um projeto durante anos, envolvendo, além do meu nome e credibilidade duramente conquistados, toda minha família e amigos, naquela fantasia que ocupou boa parte da minha razão de viver. O Jürgen foi parceiro e amigo durante a fantasia e após o tsunami. Sempre ao meu lado, chegou a arrumar uma mala para mim quando, às vésperas do natal e em meio à festa de confraternização do escritório de advocacia, desabou sobre nós uma liminar, emanada do Superior Tribunal de Justiça e eu deveria voar, literalmente, para Brasília. Ver as roupas que ele colocou na mala foi muito divertido porque as mulheres usualmente ficam responsáveis por preparar a mala dos amados, filhos e esposo, mas o inverso pode ser muito intrigante e uma experiência bastante interessante. Admito que me senti aliviada quando desarrumei a mala ainda em casa, pois não viajei naquele dia.
Depois do tsunami, muitas doses de whisky, que eu tomava às escondidas, para que ninguém soubesse que eu estava afundando, resolvi me levantar, porque sabia que meu tesouro era muito valioso e nada além das trevas deveria impedir nossa plenitude. Sou religiosa desde sempre e sei que por onde passa o bem, também afronta o mal. Sei que o mal se alimenta da espera, do momento oportuno. Assim, iniciei uma busca espiritual daquelas que todos já ouviram falar, ou seja, diante do desespero, nos enveredamos pelas religiões, com oferendas aos espíritos, visitamos igrejas e às vezes chegamos a fazer libertação no altar. Não cheguei a tanto, mas fui até o tarô onde o intérprete disse que eu precisava de energia e que não deveria frequentar velórios ou me aproximar de tristeza profunda, energia negativa, ou maldade, porque estava frágil e poderia ser abduzida. Brincadeira, ele não falou em abdução, mas eu pensei nisso.
Adorei aquela entrevista e ao final ele me perguntou se conhecia o Johrei. Disse que sim, mas não tanto. Pois bem, o Johrei é a transmissão de energia através da palma da mão. Comecei a frequentar e essa filosofia mudou toda minha vida. Esse relato se justifica para esclarecer o quanto a base é importante em uma história de amor. Comecei a frequentar a igreja todos os dias e logo me identifiquei com o jardim e a pessoa que cuidava dele. Ela era incrível. Com um grave problema familiar, também advogada, passava horas podando as plantas e, considerando que o jardim é bem pequeno, conclui-se que ela realmente é lenta. Lenta, querida, amada. Me ensinou muito sobre o jardim, a preparação do solo, a escolha das flores, o plantio, a rega e a alegria de ver o todo. Li no livro A Cabana o encontro do personagem principal com o “seu jardim” e imediatamente me identifiquei com aquele encontro com Deus e o meu jardim. A preparação do solo não só é importante, mas fundamental. A base refletirá o final. Assim se explica o quanto é grande o meu amor pelo Jürgen e porque em nenhum momento abri mão da existência dele.
Naxos, Grécia
Arquivo pessoal
Não tenho poder de decidir sobre a existência de alguém, apenas posso dizer que será o que Deus quiser mas que o que eu quero é a vida. Assim, quando recebi aquela ligação, a meia-noite, após tomar meia garrafa de vinho e estar preparadíssima para subir até minha casa na Ilhabela e dormir o sono dos anjos, respondi calmamente ao policial quando ele perguntou se eu iria subir a serra, de volta a São José dos Campos. Eu não queria e nem deveria porque havia dirigido mais de quatro horas em uma estrada em obras e meu estado físico não permitia permanecer mais tantas horas ao volante, mas quando ele me disse que o estado do Jürgen era gravíssimo, apenas disse que sim, eu subiria imediatamente. Hoje sei que se não tivesse subido, provavelmente ele estaria morto, porque o traumatismo dele era, na escala Glasgow, número 3, o mais grave. Por isso o atendimento foi todo direcionado ao trauma, não tendo sido constatada a ocorrência do enfarto. Considerando que o medicamento para um está em posição diametralmente contrária ao para o outro, não fosse a transferência dele logo pela manhã, não teria sobrevivido. O importante é que daquele momento até hoje, jamais me desesperei. Quando cheguei ao pronto-socorro, alguns amigos mostravam no olhar que não havia esperança. Os médicos, menos ainda. Levei as crianças para casa, com a Blume, nossa cachorra e sentei na sala sozinha e pensei, e agora? Falar com a família do Jürgen. Milhares de vezes eu havia pensado no que faria em um momento como esse e a resposta já estava pronta, ou seja, chamar meu vizinho alemão que, por sorte, estava em sua casa aquela noite, apesar de viajar constantemente a trabalho. Ele me atendeu prontamente, ligou para o irmão do Jürgen e depois pensamos no que faríamos nos momentos seguintes.
Nossa vida é envolvida em amor, razão pela qual nosso jardim está plantado em um terreno preparado com o máximo esmero. Logo que o Jürgen veio morar no Brasil, ainda à época do fax, aparelho que imprimia mensagens recebidas, me lembro de uma que encontrei, onde o irmão dele, outro alemão de mais de 1,90m de altura, desenhou um coração grande, com lágrimas de saudades. Depois de explicar a ele sobre a gravidade, pensamos, meu vizinho e eu, e agora? Ok. Outro vizinho, médico, que nos atendeu e orientou. Se meu esposo e pai dos meus filhos poderia morrer, deveríamos estar por perto. Tirei as crianças da cama e fomos para o pronto-socorro, onde a gravidade do quadro nos deu a permissão para entrar no centro de terapia intensiva. Quando olhei para o Baby, com a cabeça estourada, consegui ver apenas a luz do sol forte que quase me cegava, entrando pela janela embaixo da qual estava posicionada a cama e pensei: Deus está aqui, não preciso me preocupar. Ao final da visita, por volta das 09:00 horas, esperando a ambulância que o levaria para outro hospital, apesar da resistência dos médicos mas por orientação do meu vizinho-médico, que foi fundamental para salvar-lhe a vida, uma enfermeira perguntou-me como conseguia não só manter a calma naquele momento, mas transmitir isso para meus filhos, de quinze e doze anos, a ponto deles sobreviverem a tamanha dor, sem desespero. Essa mesma paz estava comigo quando naquela noite o cardiologista de plantão me afirmou, por volta das dez horas, que eu deveria me preparar para a possível partida do Baby e eu olhei para ele e pensei: você não conhece Deus. Talvez ele conheça Deus e o meu pensamento tenha sido mais um reflexo do que eu gostaria de dizer: fique tranquilo, já conversei com Deus e está tudo certo. Naquela noite ele teve uma parada cardíaca e precisou ser reanimado. Esta certeza da verdade, a mesma que me levou a dizer sim ao pedido de casamento, me acompanhou o tempo todo. Não que o Jürgen vá sobreviver para sempre, mas que eu confio que Deus está fazendo o melhor e eu, narradora, acredito que o melhor seja ele viver, se recuperar e juntos continuarmos cuidando dos nossos jardins. Toda beleza que nos envolveu desde o primeiro encontro é a base da nossa relação, que foi sendo construída durante os primeiros anos, antes que surgissem os problemas naturais na maioria das relações. Depois daquela primeira visita à Alemanha, um mundo de sentimentos invadiu meu ser, a ponto de quase me enlouquecer.
Naxos, Grécia
Arquivo pessoal
Quando você é muito pobre, acha que não tem direito a nada. É interessante como a pobreza tem o dom de não deixar sonhar. A ignorância imposta pela pobreza não deixa que sua visão ultrapasse alguns metros de distância. Às vezes me perguntam se eu sempre quis ser advogada. Eu nunca quis ser nada. Nem pensava nisso. Apenas vivia. Minha mãe era um ser humano diferente e fixou fortemente na minha mente que eu tinha que estudar e que esta seria a única forma de emergir da pobreza. Como o personagem Forrest Gump, que correu durante horas com o seu superior militar nos ombros, sem saber porque ou até quando, assim também eu fui desembestada para frente, impulsionada pelo estudo, mas sem sonhos. Nunca sonhei com uma casa, carro novo, viagens ou casa na praia. Apenas seguia pelo dever-ser.
Retornei daquela primeira visita à Alemanha (paisagem de filme, familiares ao redor da mesa, casa linda e quentinha) com a certeza de que tudo era bom demais para mim e que, claro, eu não tinha direito e algo horrível iria acontecer. Vivíamos a era da aids, que levou Cazuza sob os nossos olhares de jovens, incrédulos, sem entender como um vírus que agredia através da nossa liberdade, do sexo, do amor, poderia nos matar. Era o que eu precisava para desmoronar meu conto de fadas. Meu psicanalista não aguentou o seu fracasso (outra brincadeira, somos amigos até hoje e ele sabe que é meu ídolo) e me indicou outra psicanalista. Acho que ele pensou: posso aguentar de patologias graves às mais simples, mas essa babaquice é demais para mim.... Lembro-me que depois de ouvir-me, a psicanalista, provavelmente doutora em não sei o que (com esse suposto currículo da prometida meu psicanalista conseguiu se livrar de mim) me indagou: então, você não tinha Aids e porque encontrou um príncipe encantado a aids simplesmente surgiu no seu sangue? Ah, que raiva. Ok. Sou louca por ter medo de ser feliz ou não ser merecedora da felicidade? Está bem. Mas você poderia ser mais gentil comigo, brincar, rir e dizer: garota, vá até lá e viva intensamente este momento. Mas ela não era tão animada assim e simplesmente me aguentou por um mês quando desisti de pagar seus vultuosos honorários para curar Aids “mental” que na época não tinha cura e acho que nunca terá!
Resolvi que aceitaria ser feliz e vivemos intensamente nosso amor. No verão europeu daquele ano, viajamos quarenta dias, entre Alemanha, França (Paris, Rouen, Mont Saint Michel), Inglaterra (Jersey) depois Luxemburgo, Grécia. Transformamos a percurso Brasil-Alemanha em simples ponte aérea. Ele enganava a mãe dele dizendo que iria trabalhar na França e vinha ao Brasil. Era super engraçado comprarmos aqui um presente com jeitinho francês para entregar à minha sogra querida. Uma vez, eu estava com a mala pronta para ir ao Rio com algumas amigas, quando ele me telefonou e perguntou o que estava fazendo. Depois de alguns minutos de conversa, perguntou porque ao invés de ir ao ensolarado e alegre Rio de Janeiro não iria à cold Germany. Pensei por alguns minutos e, olhar divertido perdido no nada, disse, porque não? Liguei para agência de turismo e disse que queria viajar para Alemanha ao que a atendente me indagou sobre da data da viagem e respondi: hoje! Naquela época, há dezenove anos, não era tão fácil viajar e também a garota da agência adorou entrar nesse clima romântico e, trocando completamente a mala, de verão para inverno, algumas horas depois já estava nos braços do meu amado.
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