SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A julgar pelas idas e vindas que os processos a que já responde na Justiça Federal em Brasília já tiveram, o ex-presidente Lula terá uma longa tramitação pela frente até o desfecho de seus casos que anteriormente estavam no Paraná.
O petista foi beneficiado na última semana por ordem do ministro Edson Fachin (STF) que anulou sentenças e determinou que quatro ações penais abertas a partir da Lava Jato em Curitiba reiniciem a tramitação no Distrito Federal, isso por não terem vínculos diretos com a Petrobras.
No DF, Lula já conseguiu decisões definitivas para absolvição ou trancamento em três processos em que era réu.
Há outras três ações abertas, porém, sendo que a mais antiga tramita desde 2016, mesma época em que começou a ser processado no Paraná, sem que haja uma perspectiva de assinatura de sentença logo.
O caso mais cheio de percalços no DF é o que mira também seu filho mais novo, Luís Cláudio. Em um desdobramento da Operação Zelotes, pai e filho viraram réus em processo que trata da compra de caças pelo governo federal e da edição de medida provisória que prorrogou incentivos a montadoras.
Os dois são acusados de lavagem de dinheiro e de organização criminosa --o ex-presidente também responde por tráfico de influência.
Uma empresa de Luís Cláudio, a LFT Marketing Esportivo, recebeu de 2014 a 2015 R$ 2,55 milhões de um escritório apontado como sendo de lobistas.
Segundo o Ministério Público Federal disse na denúncia, houve uma simulação de prestação de serviços pela firma de Luís Cláudio, e o dinheiro foi pago para influenciar decisões do governo federal à época.
A Procuradoria também afirma que o filho do ex-presidente plagiou textos na internet ao elaborar relatórios que justificariam a suposta consultoria que disse ter prestado ao escritório dos lobistas.
Até hoje ainda não aconteceu o interrogatório do ex-presidente nessa ação, etapa fundamental para que o processo avance.
O juiz responsável, Vallisney Oliveira, marcou o depoimento pela primeira vez em 2017, mas a audiência acabou adiada em sucessivas ocasiões, inclusive por ordens de segunda instância seguindo pedido da defesa. A previsão agora é que o interrogatório ocorra em 27 de maio.
As defesas argumentavam que não havia como os réus serem questionados em juízo antes da resposta de autoridades estrangeiras sobre pedidos para ouvir testemunhas que vivem fora do Brasil.
Na lista dos depoimentos a serem colhidos, estavam os dos ex-presidentes franceses Nicolas Sarkozy e François Hollande, além do primeiro-ministro sueco Stefan Löfven.
A França e a Suécia disputavam o contrato do governo brasileiro para a compra de caças. A sueca Saab acabou sendo a escolhida em 2013, em um negócio de US$ 4,5 bilhões.
Em 2018, a audiência do ex-presidente foi suspensa na véspera da data marcada, também por ordem de um juiz do TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região).
"O que não se pode é esperar eternamente o cumprimento de diligência internacional", escreveu em 2019 o juiz Vallisney, que citou na ocasião o princípio da "razoável duração do processo".
O depoimento dos franceses, pedido em 2017, só chegou à Vara Federal em fevereiro de 2020. Houve ainda uma discussão de meses sobre quem pagaria pelos serviços de tradução do material enviado por autoridades da França.
A defesa de Lula argumentou que ele estava com bens bloqueados por decisão de Curitiba, não tinha como arcar com os custos da tradução pediu a gratuidade à Justiça, o que foi negado. Em fevereiro, por fim, despacho informou que o pagamento da tradução tinha sido feito.
As autoridades suecas responderam em 2018. O Reino Unido, também acionado, pediu garantias em 2019 de que a cooperação não provocaria a abertura de processo contra a testemunha.
Pedidos de colheita de depoimento no exterior também foram feitos na ação que tramita há menos tempo no DF, na qual o ex-presidente é acusado de corrupção envolvendo linha de crédito para a Odebrecht na África.
O TRF-1 mandou suspender por seis meses, em novembro passado, o interrogatório de Lula nesse caso para aguardar a resposta de autoridades de Angola.
Antes, o juiz Vallisney tinha colocado a possibilidade de ouvir testemunhas fora do país por vídeoconferência, citando a necessidade de celeridade.
O pedido dos depoimentos, de 2019, inclui o ex-presidente angolano José Eduardo dos Santos. Os ex-ministros Paulo Bernardo e Antonio Palocci também são réus.
Na Lava Jato em Curitiba, o então juiz Sergio Moro costumava barrar pedidos para tomada de depoimentos fora do país.
Moro, hoje ameaçado de ser considerado pelo Supremo parcial em sua atuação em casos do petista, expediu a primeira sentença de Lula, agora anulada, depois de dez meses de tramitação do processo, entre 2016 e 2017.
A 13ª Vara Federal de Curitiba, na qual atuava o ex-juiz, é especializada em crimes financeiros, e o titular se dedicou apenas a casos ligados à Lava Jato, o que acelerou suas iniciativas.
Realidade bem diferente ocorre no DF. Em 2018, o TRF-1 afirmou que a 10ª Vara Federal, que recebeu casos de Lula, estava em "situação quase caótica" pelo acúmulo de casos complexos, fruto de uma sequência de operações da PF.
Na ocasião, casos foram distribuídos para outros juízes de primeira instância. Isso afetou outro processo da Zelotes em que Lula é réu, acusado de corrupção por supostamente ter participado da "venda" de outra medida provisória que beneficiou o setor automobilístico.
Nessa ação, porém, ele já prestou depoimento, um ano atrás. Na ocasião, disse que o Ministério Público "mentiu na acusação porque a Polícia Federal mentiu no inquérito". Também afirmou que Palocci deve ter recebido "um prêmio" para acusá-lo. É o caso em estágio mais avançado entre os três.
O ritmo de tramitação dos casos pode ser decisivo para definir, por exemplo, o status dos direitos políticos do ex-presidente. Se ele for condenado, e a sentença for confirmada em segunda instância, ele ficaria sujeito à Lei da Ficha Limpa. Esse cenário, hoje, é improvável que ocorra antes das eleições de 2022.
A anulação dos casos que estavam no Paraná, ordenada por Fachin, ainda será avaliada pelo plenário do Supremo. A Procuradoria-Geral da República recorreu da decisão, e o assunto será avaliado por outros dez ministros da corte.
Lula sempre negou que os pagamentos recebidos pela empresa do filho Luís Cláudio tivessem origem ilícita. A defesa já afirmou que o plágio apontado pela PF corresponde a uma pequena parcela das informações dos documentos relativa a dados públicos incluídos na consultoria. Também disse que no período investigado Lula já não era mais presidente.
Em relação ao caso que envolve a Odebrecht, a defesa afirmou na época da abertura da ação que ele jamais solicitou vantagem indevida e que a acusação tentou atribuir responsabilidade penal ao então presidente por "decisões legítimas tomadas por órgãos de governo".
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